sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Este belo Natal

Numa gélida e natalícia rua, sozinho, um menino procura uma específica loja por lá aberta. Entra numa com guloseimas de montra convidativas e brinquedos coloridos ao fundo sem sequer reparar que passou da rua fria à loja de confortável temperatura. Esse desejo extra-físico e corporal que cegamente o fez ver os artigos que o Natal fizera chegar àquele estabelecimento, que denota já sobre as suas paredes e demais estruturas idade pesada, explicava-se pela idade tenra e juvenil das suas pernas, que o apressaram até à prateleira mais afastada. Automático, o rapazito alcança uma caixa de madeira antiga com alguma inconveniente poeira - pelo sopro forte extinta - e com dois bonecos nela desenhados: um pai-natal acompanhado por um pequeno e prestável gnomo. Sem dúvida que o invólucro que segurava fazia parte do século precedente ao do nascimento do nosso protagonista, mas, com mais certeza ainda, ele reconhecia o grafismo: de onde? não sabia. Mas conhecia-o e jurava-o mentalmente. O que teria provocado aquele instinto que o fez alcançar a inexplicável e desejada caixa de madeira? Não sabia, mas tinha a certeza que algo de mágico, que só a alegria e a unicidade do Natal conseguiria explicar, se encontrava no seu interior.

Num improvável dia sem clientes, o dono da loja, sentado em parte sobre uma cadeira e em parte sobre a idade, sossegadamente lia um livro muito antigo. Naquela época era costume a loja ter clientela de sobra, sobretudo de pessoas já antigas como o livro e o dono, que procuravam as coisas que as faziam sonhar nos Natais longínquos das suas infâncias. Com estranheza, quem entra é um menino, que sem ver nada do exposto - excepto, com um olhar vago, os chocolates à entrada - se penetra rapidamente na parte mais afastada da loja, agarrando a dita caixa de madeira de indecifrável conteúdo. Surpreso com este acontecimento inesperado, diz o velho dono:

- Raios te partam, Joãozinho, o que vieste aqui fazer com este frio? A tua mãe não pode ir às compras sossegada que a desobedeces logo e sais de casa!
- Desculpa lá avô, vim só buscar os comandos da consola. Podes vender a caixa, eu é que já não sabia do raio dos comandos. Só agora é que me lembrei que era aqui que os guardava.
- Muito bem, vê lá se tens juízo a voltar para casa. Como está a ser o Natal, já agora?
- Bom, farto-me de jogar Grand Theft Auto 5™ e Watch Dogs™ na Playstation 4™ da Sony®.
- Está bem, vá. Juizinho.
- Adeusinho, avô. Feliz Natal.
- Dá um beijinho à tua mãe.

E a caixa, que simboliza tão claramente o espírito de Natal que aproxima distantes gerações, foi vendida a um transeunte daquela rua que a conseguiu por dois euros e meio somente depois de regatear um pouco.

Feliz Natal a todos os dois leitores do Vou Escrever Um Blogue, e que 2015 seja melhor do que a maioria dos anos do século dezassete.

Sem comentários:

Enviar um comentário