quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Não percebo


Não percebo
porque é que se tem que perceber
aqueles que teimam em não perceber.
Ah manifesto! Ah perfeição deles!
Que se vejam e que se notem!
Que não se apague a chama
que tanto os detém e cega e blinda.

Encharquem-se as candeias invisíveis
que não têm lugar nesta razão!
Viva! Viva! Notem que estão certos!...
Ingénuos!? Ouseis vós em deter quaisquer
ostentações oblíquas à Ciência insuportável,
que Estudos comprovados por Doutores e
Professores e Senhores Magnatas sustenta.

Isso é belo, óbvio, sereno, Inquestionável!
Vê-se! Viu-se! Afogar-se-ão por ventura nesse
mesmo óleo que outrora servira para repugnar
indigentes e canalha das ciências incertas!
Por certo darão como incerto a certeza que
se aventurarão em largas chamas do subterrâneo.
Mas que lhes agradará: isso não dão como incerto 
porque lhes convém! Interesseiros! Ciganos! Canalha!

Cessem por fim! Óbvios! Chamar-me-ão
isto ou aquilo ou até (chocante!) aqueloutro!
Que vis, seus indigentes! Sentir-me-ei calhandrado,
caluniado! A minha indiferença subirá de altíssima
para (pasmem-se) inexistente! E isto é deveras
significante e aconchegante para aqueles
que tudo fazem para pôr os nervos de
belas pessoas na pontinha minúscula dos cabelinhos
finos e castanhos escuros movimentados pelo vento.

Mas calo-me, de rompante. Num pensamento
tão solto como um cabelo vem-me a imagem
de algo tão semelhante quanto a cabeça que o impede
de se soltar. E o que está lá dentro faz-me pensar, como
seria de esperar, infelizmente. E o que me faz pensar
dedica-me ao inumerável sofrimento constante irracional.
Dividir-me-á num ser que cisa tão concretamente duas
realidades fundidas numa obscura incompatibilidade.

E revejo-me como um herói de muitos que usavam também
esta característica de sentir e doer e querer sadicamente,
infelizmente, concretamente radicar ideias que
profundamente se colocam em situação de ferir e de
cobrar indevidamente a mágoa mal parada. Porque
abana a alma no interior de um corpo frágil, o coração
parece padecer de uma doença invejável que
força os sem força a desejar também eles terem ciência.


(A subtileza inerente a qualquer dito "poeta" de conceder ao título da obra o descuido propositado de guardador do primeiro verso agrada-me superficialmente.)

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