domingo, 27 de abril de 2014

Créditos

Realizador:
Homem

Produtor executivo:
Sonho

Produtor #1:
Sucesso

Produtor #2:
Auto-realização

Actor principal:
Antecipação

Actor secundário:
Acaso

Participação especial:
Sorte

Director de Casting:
Geração

Compositor artístico:
Natureza

Editor:
Presente

Argumentista:
Destino

Agradecimento especial:
Morte

domingo, 13 de abril de 2014

Os agudos da vida

Há que haver Motivo.
Caso contrário, dizem,
Não há motivo para
Haver vida viva,
Que a vida morta
Assemelha-se à
Morte-ela-própria.

Por isso, quer haja
Motivo para motivar
A vida a ser vivida
Ou quer haja vida
Para, na consequência,
não ser motivada a morte,
Haverá sempre vida
Enquanto não houver
Para sempre morte.

quinta-feira, 3 de abril de 2014

Carta à minha melancolia

Melancolia:

Pensei bastante antes de te escrever esta carta, que perde o estatuto só por ser remetida a algo que não existe. Quer dizer: existes, mas a tua existência é apenas condicional e a tua condição não te permite ler palavras, ora o teu desejo compulsivo de devorar pensamentos.

O que te quero dizer é que estou doente contigo e que, embora não repares em muita coisa a ti adjacente, me estás a consumir tão ferozmente quanto um lobo faminto devora a sua presa outrora fugitiva. A tua negra podridão destrói-me a vida porque ao me fazeres deambular entre pensamentos depressivos e melodramáticos - estes cuja origem permanece ao longo do tempo um mistério indecifrável para mim, que tenho uma vida agradável segundo os que a especulam - generalizas os detalhes, as pequenas coisas: torna-las carrascos do quotidiano que não me deixam ver que a simplicidade também tem lugar no mundo.

Frequentemente me deparas com a virtual corrida ante a janela aberta do oitavo andar de um prédio qualquer com a finalidade de concretizar um mergulho de cabeça em direcção ao pavimento de betão. Mas eu tento, por via da vã racionalização, explicar-te que tal acção soltaria lágrimas demasiado pesadas para o mundo aguentar. Que a pintura no chão resultante não seria obra de arte nenhuma: apenas o escarlate que o acaso se encarregaria de distribuir pelo espaço bidimensional que aparou a minha queda. Que mais tarde viria um homem limpar tudo para mal da sua sorte e que a culpa disso era toda minha! Há demasiada sujidade num inocente salto: há demasiada complicação no simples instantâneo.

Mas não penses que a minha doença resulta da tua doutrina derrotista. Não penses que todos estes teus entraves servem como modi operandi do meu organismo vital: das consequências físicas daquilo que me toca no pensamento. Viver contigo na consistência do tempo, nas decisões diárias e concretas da vida, tornou-me somente aquele que olha para o seu interior com desconfiança; sabendo que ele próprio construiu um inimigo fatal. Por isso, Melancolia, me referi nesta carta a ti e ao outro que a consciência construíste - mas que não sou eu.

Mens agitat molem.